Senhora sentada sozinha

Solidão é como estar numa sala de espera onde, do outro lado, não há ninguém para lhe atender.

Ciro Pellicano.


Nascemos sós e morremos sós. A solidão acentuada pela impossibilidade de repartir como nos sentimos a respeito. Como não temos relatos, podemos interpretar, dar sentido. O nascimento pode ser a passagem de um lugar seguro, confortável, onde tudo nos era provido, para um mundo barulhento, onde nossas necessidades são anunciadas por desconforto e dor; ou pode ser o início de uma aventura rumo à construção da nossa história, única, fascinante. Assim com a morte: ela pode ser o fim de tudo, o desalento, o desamparo de projetos infindos, ou o ponto final de uma trajetória de quem aproveitou a oportunidade.
Se nascer e morrer são atos pessoais, experiências solitárias, o intervalo entre um e outra admite escolhas. E a solidão, que se impõe no inicio e no final, é evitada, combatida com uma energia típica de quem não a conhece, e por não conhecê-la, a teme.
E, no entanto, quando nos permitimos serenar, acalmar nossos medos descobrimos que a capacidade de estar só pode ser cultivada, mais que isso, podemos concluir que estar só é uma necessidade.
Estar sozinho é diferente de estar solitário. A solidão de alguém sozinho é como um campo que tirou um ano sabático, é terra descansando, preparando-se para ser cultivada; é espaço aberto, é casa com portas e janelas abertas, é silêncio povoado, tem a leveza de algo que é escolhido, circunstancial, tem finais e recomeços imperceptíveis, reconcilia, revigora, capacita para a convivência com os outros.
Alguém sozinho curte a própria companhia e quando escolhe viver com, não o faz por carência, mas pelo prazer de conviver; sabe que a saudade é uma coisa boa, que revoga distâncias e ignora o tempo e tanto pode ser a lembrança e a gratidão por algo que não voltará como a  esperança de reencontros e presenças; os afetos, presentes e passados, fluindo, preenchendo as frestas que as ausências deixam. Quem convive bem consigo próprio lembra um pouco as árvores que perdem as folhas no inverno: elas guardam dentro de si a força necessária para, na primavera, ressurgir renovadas e cheias de energia. Períodos de solidão podem contribuir para novos jeitos de ver e de ser.
E há, também, as solidões que se impõem. A solidão dos presidiários, dos enfermos, dos velhos, dos depressivos, e dos internautas que, por ignorância ou medo, confundem um pontinho na tela com relacionamento e aceitam amizades empobrecidas pela falta de calor, de toque, de cheiro, de olhares que tudo comunicam.
Seja qual for o caso, a solidão não é para ser subestimada, combatida ou preenchida. Ela precisa de um sentido e este pode ser o autoconhecimento, o cultivo da sensibilidade,  ou a generosidade de ouvir a solidão dos outros. Ou tudo junto, já que a solidão nem sempre é perceptível ao primeiro olhar e não tem nada a ver com a presença ou ausência de pessoas.
Por ser interna, é no nosso interior que a solidão precisa ser processada. O paradoxo que se impõe é que, para aceitar a solidão como algo positivo, precisamos nos recolher. É na quietude que percebemos a beleza da música, é fechando os olhos que sentimos melhor o gosto das coisas, é no abraço silencioso que comunicamos nossa solidariedade.
No mundo barulhento e tumultuado em que vivemos, um pouco de penumbra e silêncio, um pouco de leitura e espiritualidade, um pouco de introspecção e autoexame podem nos reconciliar com o fato de que embora ansiemos por companhia e o conforto de pertencer seja indispensável, estar sozinho não é nenhuma tragédia.
Alvaro Loro – Storyteller

Um pensamento sobre “Solidão

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